Oi gente, como vocês têm estado? A tensão continua entre sai ou não sai a Dilma, entra o Temer, com Cunha, Renan e toda aquela turma. Incrivelmente, parece menos assustador falar sobre transplante de órgãos, não é mesmo? Portanto, vamos lá!
Mas atenção: tudo que falarei aqui hoje se aplica ao caso de doação renal de doador falecido, ok?
Bom, diferentemente da dinâmica de um transplante cardíaco ou de fígado, a doação renal não possui uma fila. Sim, não se trata de uma fila mas de uma lista. Explico:
Uma fila tem por premissa o atendimento por ordem de chegada. Assim, caso o candidato tenha a mesma tipagem sanguínea que o doador, o candidato que estiver a mais tempo na fila será o contemplado pelo órgão. Já no caso de uma lista, independentemente da ordem de chegada, o candidato a ser contemplado será o que tiver maior compatibilidade com o doador. Portanto, o candidato pode ter entrado no mesmo dia que em que o órgão seja disponibilizado e ser contemplado com a doação.
Mas....como se estabelece essa compatibilização?
Ela é complexa e leva em conta os seguintes fatores:
- A compatibilidade ABO;
- A priorização;
- A idade; e
- A compatibilidade HLA.
Primeiramente, a compatibilidade ABO é a compatibilidade de tipo sanguíneo sem levar em consideração o fator RH. Para entender melhor, veja o meu exemplo:
Eu tenho tipo sanguíneo B e fator RH negativo, logo sou candidato à recepção de doador tipo:
O (que é o doador universal) e
B (que é o mesmo tipo sanguíneo que o meu).
Reitero que independe o fator RH, e isso é uma ótima notícia, porque essa regra não é válida para doação e recepção sangüínea.
"Segundamente" (como diria Sr. Odorico Paraguaçu, prefeito de Sucupira - BA), o sistema leva em consideração a situação de o candidato não ter acesso a nenhum tipo de diálise. Esse favorecimento é chamado de priorização e é feito por solicitação da equipe médica responsável pelo transplante. Esse, possui validade de 30 dias podendo ser renovada.
Em terceiro lugar, há o fator idade. Tão mais novo, maior a expectativa de sobrevida, maior o "favorecimento". A regra é, em geral, assim, mas obviamente que não há doação de um rim de um adulto para um bebê.
Por fim, é feita a tipagem de fatores conhecidos como HLA (em português, Antígenos Leucocitários Humanos). Os fatores HLA são subdivididos em 6 itens de complexa organização e aí é que reside a parte mais difícil. Como esses itens podem ter muitas variações, a compatibilização entre doador e receptor quase sempre não é perfeita e é buscada ser a mais próxima possível.
E quem faz essa compatibilização toda?
O Ministério da Saúde gesta o SNT (Sistema Nacional de Transplante), um órgão exclusivamente voltado para a condução da temática de transplante de doadores falecidos no Brasil. Dentro do STN há o CTN (Cadastro Técnico Único) operado em sistema 100% informatizado, o SIG (Sistema Informatizado de Gerenciamento). Por sua vez, este CTN é composto pelos potenciais receptores brasileiros, natos ou naturalizados, ou estrangeiros residentes no Brasil, que é a lista a que me referi anteriormente.
Eu questionei o meu médico assistente quanto à seriedade deste Sistema, visto que é mais do que claro que um dos comércios mais absurdos e rentáveis do mundo é o de órgãos. Disse, então, ele:
- Danilo, você pode ficar 100% tranquilo porque eu conheço no detalhe a concepção dessa sistemática e é praticamente impossível ocorrer uma fraude.
Ufa! Tomara, não é gente?! Melhor acreditar nele do que viver com essa pulga atrás da orelha. Chega de absurdos nesse país.
Como se faz para se inscrever nessa lista?
O paciente é encaminhado por uma equipe de transplantes autorizada pelo Ministério da Saúde que irá representá-lo e inscrevê-lo. O SIG gerará automaticamente o RGCT (Registro Geral de Cadastro Técnico) e esta é "identidade" do candidato no sistema. Nada é nominal após este registro. Assim, o Sistema blinda os nomes dos pacientes de forma a trazer confidencialidade e não favorecimento durante toda a espera. Nova vinculação entre nome e RGCT só ocorrerá quando da compatibilização feita, automaticamente pelo SIG, e a partir daí começa a "correria" para fazer chegar o órgão ao receptor. Muitas vezes, após a compatibilização, a cirurgia ocorre em 24h!
Há fatores biológicos que dificultam o sucesso de transplante?
Sim. (1) Mulheres que já tenham engravidado, (2) pessoas que tenham sido submetidas a transfusão sanguínea e/ou (3) transplantes de órgãos possuem maior resistência orgânica à recepção do órgão. Isto porque um transplante tem íntima relação com o sistema imunológico do paciente. Funciona, em linguagem leiga, assim:
Um órgão é claramente um corpo estranho no organismo. Uma vez que nosso organismo identifica que há presente esse corpo estranho, nosso sistema imunológico começa a gerar defesas para rejeitá-lo. Para conter esse "ataque" é que o paciente precisa tomar remédios, tais como, imuno-supressores (supressores do sistema imunológico) para "abaixar a guarda do organismo". Assim, todo paciente que recebe um rim, invariavelmente deverá tomar imuno-supressores até a sua morte. O que é um ponto de extrema atenção, pois a diminuição da força do sistema imunológico coloca em risco aquele organismo que antes teria combatido naturalmente e facilmente uma "invasão". Como tudo na vida, há benefícios e malefícios no transplante.
Não é incomum ocorrer alguma rejeição nos primeiros dias pós transplante, mas a medicina atual está razoavelmente "confortável" com a condução dessa fase e obter sucessos. O problema, dizem os médicos, é quando o paciente sai do hospital. Nos primeiros anos a tensão é grande e o paciente fica atento aos cuidados pós transplante, contudo passa o tempo e o paciente...relaxa daí gera o gatilho que desenvolverá uma avalanche de efeitos que acumulados culminarão na rejeição do órgão pelo organismo. Já é comprovado que a maioria das rejeições dos órgãos acontece mais por fatores sociais e do que por fatores orgânicos. Portanto, ajude seus colegas, amigos, parentes na disciplina deste dia-dia pós-transplante. A tentação de comer mais um pouquinho, beber mais um copo, não tomar o remédio é grande mas ela é uma tentação que pode culminar com uma tragédia.
Ufa, escrevi pra caramba hoje! Mas julgo importante dividir com você minha experiência. Eu aprendi que mudar a vida de uma pessoa é mudar o mundo e eu continuo sonhador em querer mudar o mundo. Quem sabe eu mudo o seu :)
O próximo post deste blog será sobre o transplante de rins entre tipos sangüíneos diferentes.
Até lá!
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