domingo, 21 de maio de 2017

A felicidade

<< assine na lateral direita a newsletter deste blog e fique sabendo quando o autor publica novos textos >>

Ah, a felicidade...quem não quer ser feliz? Gozar de saúde própria e dos seus entes queridos; ter dinheiro no bolso e no banco; trabalhar em uma organização onde se ganha muito bem e cuja reputação é signo de status por compor seu quadro de funcionários; ter uma linda casa na cidade e outra na serra para curtir um friozinho sob a lareira e, por que não, outra na praia para curtir o Sol tropical de nossa terra abençoada por Deus; um lindo carro também vai muito bem, obrigado; poder tratar-se esteticamente sem preocupações com valores; sem falar na possibilidade de poder viajar uma ou duas vezes por ano; ter cacife para jantar fora em um restaurante bacana, no mínimo, uma vez por semana e desfrutar daquele delicioso prato que tanto te apetece; e quem sabe, ir ao teatro uma vez por semana sem apertar a carteira e, de quebra, um cineminha, porque ninguém é de ferro (salvo o Wolverine). Ah, a felicidade...é claro que todos a querem. Vivemos para sermos felizes e esses são os requisitos de uma vida feliz, não são mesmo?

Bom, eu não sou veloz em responder a essa pergunta....antes, gostaria de propor uma reflexão.

// Disclosure: É claro que há tantos outros objetos de desejo mais ou menos diferentes dos que relacionei. O que eu quis foi simbolizar para o querido leitor um exemplo de "lista de desejos" de um homem médio contemporâneo. Portanto, perdão se não fui tão exato.

Estou convencido de que fomos e somos ensinados a realizar sonhos, tal qual uma "lista de desejos" idealizada. Mais! Fomos e somos educados a entender que prazer é sinônimo de felicidade. Mais ainda! Fomos e somos treinados a enxergar que sofrimento e felicidade não podem coexistir. Portanto, não é surpresa que a depressão é uma das doenças mais comuns nos dias atuais.

Destes "lista", ergue-se um padrão de comportamento que direciona o indivíduo a querer saciar seus desejos a qualquer custo (Yes! You Can!) e a repudiar qualquer tipo de sofrimento. Funcionamos, grosso modo, assim:
- tão mais desejamos e nos saciamos, tão mais acreditamos sermos felizes; e
- tão mais desejamos e não nos saciamos, mais somos infelizes.

Veja, felicidade tornou-se sinônimo de saciar o próprio umbigo! Assim, se eu tenho um carro importado, vou querer uma Ferrari até o dia que minha Ferrari se torne somente mais um item na minha vida. Daí eu vou querer um iate. Gozarei deste prazer durante um tempo, mas chegará o dia que ele se tornará mais um bem com o qual não mais me satisfaço. Daí é possível que eu vá querer um helicóptero...e assim sucessivamente. A voracidade humana não tem fim! Sempre desejamos algo a mais, outro a mais e por não realizarmos todos os "algo a mais"... somos infelizes. É a síndrome do "eu mereço". Eu mereço isso, eu mereço aquilo, mas se acredito que mereço e não tenho, inevitavelmente sinto-me infeliz. É um ciclo vicioso e infinito em querer, saciar-se, entediar-se e voltar a querer uma nova coisa. Você acha esse padrão de comportamento saudável, razoável, inteligente? Eu não! Acho isso uma armadilha que causa angústia, frustração e uma terrível infelicidade.

Noutro dia eu escrevi aqui nestas páginas virtuais que eu queria saúde, dando a entender que essa é uma expectativa da qual depende a minha plena felicidade. Não é assim, acho que não me fiz claro. Não nego que coleciono desejos a serem realizados e ter saúde é um dos principais, já que não gozo dela plenamente. Mas não quero demonizar os desejos! O que eu quero é propor uma nova forma de nos relacionarmos com eles e, principalmente, com essa jornada pelo encontro com a felicidade. O nosso pecado reside na expectativa que depositamos sobre os desejos ao responsabilizá-los por nos trazerem a tão sonhada felicidade. Eles não a trarão! Eles não podem! Realização de desejos nos trazem prazeres, ecstasy! E ecstasy não é felicidade! 

Ainda nesta linha, confundimos sofrimento com infelicidade. Se quem sofre é infeliz, todos sob a face da Terra são infelizes já que sofrer é inevitável à raça humana! Sofrer, para mim, é um processo de amadurecimento que pode nos levar a um aprendizado, uma transmutação de nossa essência que pode nos auxiliar a encontrar a tal felicidade. Mas para isso precisamos entender a "mensagem" que vem junto do sofrimento. De forma que ao desfazermos essa confusão mental de conceitos, chegamos à ideia de que felicidade é sinônimo de paz e aceitamos que, para amadurecermos certas questões humanas, muitas vezes o caminho será pela dor, pelo sofrimento.

Mas ninguém quer sofrer, isso é óbvio. Então, como diminuir a dor? A essa pergunta dedico especial atenção todos os dias da minha vida e sei que é impossível esgotá-la. De todo modo percebi que podemos reduzir nosso sofrimento re-educando os nossos desejos, nem que isso signifique diminuí-los ou trocá-los. Mas aí temos um problemão! Trocar nossas vontades, nossos hábitos, é uma das coisas mais difíceis no comportamento humano! Não fosse assim, não teríamos, por exemplo, um planeta onde morrem mais pessoas por obesidade do que por inanição. Mudar hábitos é muito muito muito difícil. Mas ainda assim defendo que devemos buscar a ter paz neste processo, ter paz no sofrimento. Será possível? De que paz estou falando? Da paz de um monge zen-budista? Ou de um hermitão que vive isolado em montanhas no Oriente Médio? Ou de um padre franciscano pobre de marré-deci? Não, querido leitor, não é nada disso! Pode até ser que esses caminhos ofereçam paz, mas não estou falando delas mesmo porque não entendo nada sobre delas. O que trato é de uma paz interior possível de ser construída dentro de você a partir de agora, cultivada desde este exato momento. É uma paz que, como em um jardim, é preciso dedicar-se debulhar a terra, a plantar as sementes, regá-las todos os dias, aguardar pacientemente germinar seus brotos, vê-los crescer, aparar suas folhas, passar por Sol e chuva, vento e mormaço, cuidar, cuidar, cuidar até que, lá na frente, os frutos brotem e se ofereçam a você. Sim, os frutos! Os frutos são a felicidade, a paz nesta minha metáfora. Dá trabalho pra caramba, leva grande tempo pensando em si, na sua mente, no seu corpo cultivarmos nossa paz interior. E quem tem tempo e/ou paciência para aguardar os ciclos de amadurecimento hoje em dia? Conversando com um amigo que trabalha com jardinagem, descobri que as pessoas compram árvores já maduras para seus jardins! Não querem nem esperá-las crescer! Assim, aprendemos que tudo deve ser para agora e que o que não está bom podemos (devemos?) trocar. Trocamos de celular, computador, TV, amigos, emprego, trocamos de família! Não sabemos mais consertar as coisas, consertar os relacionamentos, nos dedicar ao trabalho contínuo e modestamente progressivo do cuidado. Não sabemos consertar a nossa alma, cultivar nossa paz interior e, por incompetência, a substituímos por prazeres. Esses sim, atendê-los é bem mais fácil. Beeem mais fácil! Mas, como falei, pelos prazeres entra-se num ciclo vicioso de querer, saciar-se, entediar-se e querer de novo que nos leva ao....? À infelicidade. A paz de que eu falo é perene, é um dom de Deus, disponível a qualquer um de forma gratuita. Diferente dos prazeres, ela não tem preço porque não pode ser comprada. Mas ela exige que seja cultivada quotidinamente, longamente, pacientemente. E quando se tem um vislumbre do que é essa paz, mesmo diante das atribulações, mesmo diante da inevitável companhia do sofrimento, ela te preenche, te acompanha, te acalma e faz você seguir em frente. Ela te ensina a ser resiliente.

Não quero terminar esse longo texto sem falar dos abastados. Digo abastados de qualquer coisa: dinheiro, saúde, prazeres... Eles acreditam não precisarem de mudança interna, uma vez que têm seus desejos atendidos e, daí, julgam-se felizes do jeito que são mesmo que tenham que, infinitamente, substituir seus desejos por outros desejos. Quando a gente tem tudo (ou quase tudo) que quer, a gente se sente poderoso, quase invencível (Yes! You can! Again). Porque a bonança gera a displicência em enxergar os nossas necessidades de melhoria, e essa displicência nos leva à ideia de que somos fodas, e se somos fodas merecemos nos saciar. Com o que? Com os prazeres novamente. Até que...Deus o livre!...um dia O Desafio chega, e com O Desafio a reflexão, e com a reflexão uma nova oportunidade de mudança. Porque aquela falta de saciedade tinha origem na necessidade de mudança interior que não enxergamos enquanto estava "tudo bem".  Mas agora O Desafio chegou. Queria estar errado, mas se você duvida desta tese, converse com algum familiar, um amigo próximo que tenha passado por um grande momento de dificuldade...pergunte-lhe se ele concorda comigo. 


Feliz daquele que não deposita nos prazeres a sua felicidade, mas sobre uma paz interior. Esse sim, no gozo do prazer, sabe ter consciência de quem ele é e do que precisa mudar; sabe no enfrentamento do sofrimento ter paz interior e seguir em frente. Este homem, esta mulher, sabe ser feliz. Madre Teresa, Chico Xavier, Mahatma Ghandi, Jesus Cristo. Todos eles e tantos outros gozaram de prazeres simples na vida e também sofreram muito, mas foram eles que encontraram algo tão grande dentro de si ao ponto de a ensinaram à humanidade o que era esse sentimento....possuíam paz interior e, assim, eram felizes.

#Paz


Nenhum comentário:

Postar um comentário